sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A Camareira



                                                
                                               Acredito ter um faro ou sei lá o que,  que me
impele a encontrar livros bons entre tantos lançamentos e novidades que aportam na livraria Entrelinhas todos os dias. Quando abri a caixa da L&pm Editores, A Camareira atraiu-me como se tivesse um ímã. Não resistí. A orelha me informou que o autor, do qual nunca tinha ouvido falar, Markus Orths é um guri de 42 anos, alemão,  com dez livros publicados e traduzidos para diversas linguas, muito premiado e festejado pelo mundo afora. Comecei a leitura na livraria mesmo, numa mesinha do café. Aos poucos fui entrando no mundo de Lynn, a camareira, que ao não se sentir normal parece
Markus estar disposta a aprender a viver e para isso tenta bisbilhotar os objetos dos hóspedes do hotel em que trabalha, chegando ao ponto de ficar escondida sob a cama em certos dias. A cada página aumenta o envolvimento do leitor com uma personagem só e indefesa num mundo que não a ajuda e nem a compreende.

Um trecho do imperdível A  Camareira:

                        Quando era criança, encontrou certa vez uma concha na praia, levou a concha para a mãe que estava estendida ali em trajes de banho, branca como um queijo sob o guarda-sol, com seu livro.
                        Uma concha, disse Lynn, encontrei uma concha.
                        A mãe disse, coloque-a sobre o ouvido.
                        E Lynn colocou a concha ao ouvido.
                        O que você ouve?, perguntou a mãe.
                        Um murmúrio, disse Lynn.
                        É o murmúrio do mar, disse a mãe, as ondas que estão presas na concha.
                        O mar?, perguntou Lynn.
                        O mar, disse a mãe, e continuaou a ler.
                        Como, pensou Lynn, como é que uma concha pode prender o mar, como pode algo tão pequeno e frágil como uma concha prender algo tão grande e indestrutível como o mar, as ondas do mar, o murmúrio do mar? E então levou a concha para seu quarto e a colocou sobre o criado-mudo, e, como não conseguia dormir,  ficou segurando a concha colada ao ouvido, olhando fixamente para a escuridão e ouvindo o rumor das ondas. Pegou o copo de água e o esvaziou, e só porque pegou o copo de água e o esvaziou pôde segurar o copo de água vazio na mão, e só porque colocou de repente sobre o ouvido, e só porque colocou o copo de água sobre o ouvido ouviu o mesmo murmúrio que ouvira da concha, as mesmas ondas, o mesmo vento. E Lynn recolocou o copo no lugar e atirou a concha no cesto de papéis, porque tinha de repente pressentido que tudo na vida é um engano.


A Camareira
Markus Orths
L&pm Editores

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