terça-feira, 29 de julho de 2008

Fragmentos I


Um Juiz às Direitas

Um ricaço muito avarento perdera um saquitel com boa soma de dinheiro em ouro. Deitou logo anúncios nas folhas, prometendo cem táleres de alvíçaras a quem lho restituísse. Um camponês, que tinha encontrado o saco, foi contentíssimo entregá-lo ao nosso homem. Este contou e tornou a contar o dinheiro, e, depois de certificar-se de que nada faltava, disse com a maior serenidade para o camponês:
“Deviam estar aqui dentro oitocentos táleres; não encontro senão setecentos; vejo que vossemecê teve o cuidado de tirar por suas próprias mãos os cem que eu tinha prometido: estamos pagos.”
O Campônio ficou pasmado, porque não tinha tocado no dinheiro, e semelhante recompensa de modo algum o podia satisfazer. “Vamos ao Sr. Juiz,” exclamou ele muito azedado com a história; “não, senhor, isso não fica assim; vamos ao Sr. Juiz e o que ele disser é o que se faz.” Foram. O Juiz ouviu um e outro com a maior atenção, pensou um pouco sobre o caso, e por fim saiu-se com esta sentença:
“Vossemecê,” disse ele, voltando-se para o ricaço, “perdeu um saco com oitocentos táleres, e vossemecê,” continuou o magistrado, dirigindo-se para o campônio, “achou um saco com setecentos táleres. Muito bem. Está provado que o saco que vossemecê achou, não é o mesmo que este senhor perdeu; e portanto tome vossemecê outra vez conta dele, e guarde-o até que apareça alguém a reclamá-lo.” “Quanto ao meu amigo,” concluiu o juiz voltando-se novamente para o avarento, com um risinho de escárneo, “não tem outro remédio senão ficar esperando com paciência que lhe apareçam os oitocentos táleres.”

In “Seleta em Prosa e Verso” de Alfredo Clemente Pinto, Editora Martins Livreiro com primeira edição em 1884. O Autor não informa a origem deste texto, se alguém souber...

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